Publicado em 20 de outubro de 2025 às 19:48
O tradicional Círio de Nazaré e a aguardada COP30 (30ª Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas), que será realizada em Belém em novembro de 2025, colocaram a Amazônia em evidência no cenário nacional e internacional. A realização desses eventos deve impulsionar a economia, o turismo e, especialmente, a gastronomia local — rica em história, sabores e saberes ancestrais, expressos em pratos tradicionais que são verdadeiros ícones da culinária paraense. >
“A gastronomia amazônica é única, autêntica e biodiversa. Ela reúne práticas e técnicas que nasceram da floresta, dos rios e da agricultura local, combinando tradições indígenas, caboclas, africanas e europeias. Na nossa cozinha nada se desperdiça: raízes, folhas, cascas e sementes são aproveitados, resultando em uma culinária sustentável e profundamente conectada à natureza”, explica a chef Alinne Barros, responsável pela cozinha da Prática Belém e referência no uso de produtos regionais. >
Segundo dados da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), a Amazônia concentra mais de 220 espécies alimentares nativas utilizadas na culinária tradicional e contemporânea, sendo a mandioca a base de grande parte delas. Da mandioca-brava, por exemplo, extraem-se a farinha, o tucupi, o beiju, a goma e a maniva, ingredientes fundamentais para os pratos mais emblemáticos da região. >
Durante o Círio de Nazaré, realizado sempre no segundo domingo de outubro, é comum que famílias inteiras se reúnam para preparar e compartilhar essas receitas, mantendo viva uma tradição que atravessa gerações. “A maniçoba é um símbolo afetivo para quem é do Pará. Lembro da minha mãe preparando o prato todos os anos antes do Círio. Ela dizia que ainda não estava pronta, só para não deixarmos acabar antes da festa. Depois que ela se foi, assumi o preparo — e, com ele, a lembrança mais bonita que tenho desse período”, relembra a chef. >
Com a COP30, Belém também deve ganhar ainda mais visibilidade internacional, atraindo chefs, jornalistas e turistas curiosos pelos sabores locais. A expectativa é que o evento consolide o Pará como destino gastronômico do Brasil, valorizando ingredientes como tucupi, jambu, cumaru e puxuri, considerados verdadeiros tesouros da floresta. >
“Temos tantos ingredientes que é até difícil escolher qual explorar mais. O cumaru, conhecido como a ‘baunilha amazônica’, e o puxuri, com aroma intenso e notas de especiarias, têm enorme potencial para conquistar o mundo. Eles traduzem o que a nossa cozinha tem de mais sofisticado e natural”, destaca Alinne Barros. >
Abaixo, a chef Alinne Barros compartilha o passo a passo de três pratos tradicionais que celebram essa culinária ancestral. Confira! >
Em uma panela antiaderente, refogue metade do alho, a pimenta-de-cheiro, as folhas de louro e o bacon em fogo baixo. Adicione a maniva, cubra com água e cozinhe por cerca de 5 dias, mantendo sempre coberta por água. O cozimento prolongado é essencial para eliminar o ácido cianídrico da mandioca-brava. >
No quinto dia, dessalgue as carnes e refogue-as com os temperos. Acrescente à panela da maniva e cozinhe por mais2 dias, sempre completando com água. Em outra panela antiaderente, refogue o restante do alho, junte à maniçoba e cozinhe até as carnes ficarem macias e o sabor bem encorpado. Ajuste o sal e sirva quente, acompanhada de arroz branco, farinha d’água e pimenta-de-cheiro. >
Dica da chef: “A maniçoba fica ainda mais saborosa no dia seguinte — o sabor das carnes penetra melhor, e a textura fica perfeita. É tradição preparar com antecedência para servir durante o Círio”. >
Em uma panela, aqueça o azeite de oliva em fogo médio e refogue a cebola, metade do alho e a pimenta-de-cheiro até dourarem levemente. Junte o camarão seco e refogue por alguns minutos até liberar aroma. Acrescente o cheiro-verde, misture e reserve. >
Em outra panela, refogue o arroz com um pouco de azeite de oliva e o restante do alho. Junte o tucupi e complete com água quente. Tempere com sal e cozinhe até o arroz ficar macio e soltinho. Quando estiver quase pronto, misture o jambu e o camarão refogado, adicionando um pouco mais de tucupi para deixar o arroz úmido e saboroso. >
Dica da chef: finalize com um fio extra de tucupi e sirva acompanhado de peixe grelhado, pato no tucupi ou maniçoba, combinação perfeita da culinária amazônica. “Um fio de tucupi por cima do arroz pronto realça ainda mais o sabor e traz aquele toque típico da floresta”, afirma. >
Pato >
Tucupi >
Pato >
Lave os pedaços de pato com cachaça e tempere com sal, pimenta-do-reino, alho, cebola e cheiro-verde em um recipiente. Deixe marinar por 2 horas (ou de um dia para o outro). Após, coloque o azeite de oliva em uma panela e aqueça em fogo médio. Acrescente os pedaços de pato e doure todos os lados. Desligue o fogo, transfira para uma assadeira e leve ao forno preaquecido a 180 °C por 1 hora e 30 minutos. >
Tucupi >
Em uma panela, ferva o tucupi com alho e chicória-do-Pará por 20 minutos. Adicione o jambu e cozinhe até as folhas ficarem tenras e levemente adormecentes. Junte o pato e ferva por 15 minutos. Sirva em seguida. >
Dica da chef: “O tucupi e o jambu são ingredientes que contam a história da Amazônia. O segredo é respeitar o tempo de preparo e o ponto do tucupi, que deve sempre ser fervido para liberar seu sabor autêntico e seguro”, afirma. >
Por Daniela Begas >