PRF suspende agente que expôs dados de mulher trans em grupo com mensagens ofensivas

Servidor usou sistema restrito da corporação para acessar informações pessoais de uma cabeleireira e compartilhá-las em um grupo no Telegram com teor discriminatório.

Publicado em 16 de outubro de 2025 às 10:38

PRF suspende agente que expôs dados de mulher trans em grupo com mensagens ofensivas
PRF suspende agente que expôs dados de mulher trans em grupo com mensagens ofensivas Crédito: Reprodução/Redes Sociais

A Polícia Rodoviária Federal (PRF) suspendeu por 37 dias o policial Victor Hugo de Oliveira Castro, ex-chefe substituto da 3ª Delegacia da PRF em Atibaia–SP, após ele vazar informações pessoais de uma cabeleireira transexual em um grupo de mensagens no Telegram, conhecido como “Firma Curva de Rio”. A punição foi determinada em 15 de setembro pelo diretor-geral da PRF, Antonio Fernando Souza Oliveira, e o caso agora pode chegar ao Ministério Público Federal (MPF).

A investigação interna revelou que o agente utilizou um sistema de acesso restrito da corporação, o aplicativo Senatran Fiscalização, para levantar dados como nome, CPF e foto da mulher, que sequer era dona do veículo pesquisado. A imagem com as informações sigilosas foi enviada ao grupo, onde outros policiais fizeram comentários pejorativos e discriminatórios.

O episódio começou em abril de 2024, quando um policial aposentado, Arcelino Campos, pediu ajuda no grupo para identificar o dono de uma caminhonete estacionada em sua vaga de garagem. “Boa tarde, alguém consegue os dados dessa caminhonete?”, escreveu. O então chefe substituto da PRF respondeu minutos depois: “QRX, levantando o proprietário”. Na sequência, enviou a captura de tela com os dados da cabeleireira, identificada como Daniela Rodrigo, e confirmou: “Localizado”.

Entre as reações à mensagem, o presidente do sindicato da PRF no Espírito Santo, Marcelo Fávero Brandão, fez um comentário de conotação sexual, chamando a vítima de “vulgo pé de mesa”, expressão descrita nos autos como referência ao tamanho do órgão genital masculino.

Em relatório disciplinar, a PRF classificou as conversas como “inadmissíveis” e “de cunho discriminatório”, destacando que os participantes fizeram piadas de teor misógino, racial e transfóbico. Apesar disso, a corporação considerou que o agente possuía bons antecedentes, com 18 elogios funcionais, e aplicou apenas a suspensão administrativa.

A denúncia anônima que expôs o caso mencionava “atos de preconceito de gênero, misoginia e bullying” e levou à abertura de uma Investigação Preliminar Sumária (IPS). O relatório final recomendou que o processo fosse enviado ao MPF para apurar a possível violação de sigilo funcional, crime previsto no artigo 325 do Código Penal.

O MPF em Bragança Paulista, ao ser comunicado, solicitou a abertura de inquérito policial para investigar o vazamento de dados, mas entendeu que as mensagens ofensivas deveriam ser tratadas na esfera estadual, por se configurarem como atos privados dos servidores.

Em documento interno, a PRF reiterou essa posição: “Afora a questão afeta à possível violação de sigilo funcional, as manifestações discriminatórias são entendidas como atos privados, sem repercussão funcional.”

A decisão gerou críticas de entidades de direitos humanos, que apontam omissão institucional diante de práticas de transfobia e vazamento de dados. O caso também reacendeu o debate sobre a necessidade de responsabilização efetiva de servidores públicos que utilizam sua função para acessar e expor informações sigilosas.