Publicado em 1 de setembro de 2025 às 16:25
A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) começa nesta terça-feira (2) a julgar o ex-presidente Jair Bolsonaro e mais sete ex-assessores, todos acusados pela Procuradoria-Geral da República (PGR) de tentarem consumar um golpe de Estado no Brasil.
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Os cinco ministros da Primeira Turma - Alexandre de Moraes, Cristiano Zanin, Luiz Fux, Cármen Lúcia e Flávio Dino - irão julgar baseados nas provas apresentadas por acusação e defesas durante a instrução do processo.>
No caso da acusação, o procurador-geral da República, Paulo Gonet, apresentou suas alegações finais, a versão definitiva para os fatos investigados, em 15 de julho, quando pediu a condenação dos oito réus por cinco crimes, cujas penas máximas, somadas, podem ultrapassar os 40 anos de prisão.>
Todos foram acusados dos seguintes crimes:>
liderar ou integrar organização criminosa armada;>
atentar violentamente contra o Estado Democrático de Direito;>
golpe de Estado;>
dano qualificado por violência e grave ameaça e>
deterioração de patrimônio tombado da União.>
Gonet descreveu o que, para a PGR, seriam diversos atos típicos, ou seja, atos ou omissões dos réus que caracterizam crime. No entender do procurador, contudo, tratam-se de crimes complexos, executados com o intuito de não serem descobertos ou provados.>
Por esse motivo, Gonet avalia que a tipificação dos crimes imputados é igualmente complexa, sendo formada a partir de uma série de comportamentos em um espaço alongado de tempo, e não a partir de atos isolados.>
“Uma tentativa de golpe de Estado, de quebra dos elementos essenciais do Estado de Direito Democrático e de ruína da independência dos poderes, não se dá à compreensão sem que se articulem fatos e eventos múltiplos, de ocorrência estendida no tempo, que conformam o comportamento punido pela lei”, explica o PGR em sua peça acusatória.>
Para caracterizar os crimes, Gonet deu importância crucial aos ataques antidemocráticos de 8 de janeiro de 2023, quando apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro, insatisfeitos com a derrota dele na tentativa de reeleição em 2022, invadiram e depredaram as sedes dos Três Poderes.>
“O evento dramático auxiliou a ressignificar toda uma série de acontecimentos pretéritos, que antes pareciam desconectados entre si”, escreveu o PGR nas alegações finais.>
“Atos que, até então, poderiam parecer reprováveis apenas do ponto de vista moral ou eleitoral, foram encaixados dentro de um plano maior de ruptura institucional”, acrescenta.>
Gonet afirma que os atos violentos foram resultado do complô golpista e só ocorreram pelo incentivo de Jair Bolsonaro, que manifestou apoio aos acampamentos que, desde o fim da eleição, pediam a intervenção militar, incitação que em si já é crime previsto no Código Penal.>
O procurador-geral da República apresenta, por exemplo, mensagens trocadas entre o coronel Mauro Fernandes, ex-secretário executivo da Secretaria-Geral da Presidência, nas quais o militar parece fazer a ponte entre o Palácio do Planalto e lideranças dos manifestantes acampados em frente ao Quartel-General do Exército, em Brasília.>
Nas conversas, a palavra “churrasco”, segundo Gonet, é usada como código para o golpe de Estado. Uma das mensagens recebidas por Fernandes, de um dos líderes do acampamento, diz, por exemplo: “a gente tá indo lá pra esplanada, pra manifestação da esplanada, ok? É… e eu preciso falar urgente com o senhor, sobre aquela… aquele churrasco. É… se conseguiu alguma orientação ai”.>
Tais comunicações, para Gonet, deixam “evidente que os movimentos dos apoiadores de Jair Messias Bolsonaro não eram espontâneos, mas fruto de prévia orientação da organização criminosa”.>
O procurador cita ainda a ida do general Walter Braga Netto, ex-ministro da Casa Civil e da Defesa, e que foi vice na chapa de Bolsonaro em 2022, até o acampamento no QG do Exército, em 4 de janeiro de 2023, onde transmitiu mensagem de esperança a respeito do golpe.>
Em relação especificamente a Bolsonaro, o procurador afirma que os acontecimentos do 8 de janeiro somente aconteceram devido à “comoção social” alimentada pelo ex-presidente, que desde meados de 2021 passou a colocar em dúvida o processo eleitoral, com ataques, sem provas, contra o funcionamento das urnas eletrônicas.>
Gonet descreve o que seriam falas coordenadas de Bolsonaro, e diz que uma “sequência de atos - declarações públicas ameaçadoras, disseminação de falsidades sobre o sistema eleitoral, ataques reiterados a ministros da Suprema Corte, articulação com aliados militares e manipulação de inquéritos - compõe engrenagem de deslegitimação institucional, cujo objetivo central era a rejeição antecipada do resultado eleitoral”.>
A partir daí, o procurador afirma que Bolsonaro passou a agir de modo coordenado com a organização criminosa golpista no intuito de manter seus apoiadores insatisfeitos antecipadamente com o resultado das urnas.>
“Esse escalonamento da agressividade discursiva não era episódico nem improvisado. Integrava a execução de plano orientado à corrosão progressiva da confiança pública nas instituições democráticas”, afirma o procurador.>
Ainda segundo Gonet, mensagens trocadas pelos réus indicam inclusive orientação sobre como os manifestantes poderiam utilizar grades como escadas e mangueiras de incêndio de forma coordenada no suposto “churrasco”.>
O procurador-geral da República afirma não ser necessário que os réus estivessem em pessoa na praça dos Três Poderes para que possam ser considerados responsáveis pelos atos violentos e os danos causados aos prédios públicos, que foram estimados em mais de R$ 30 milhões.>
Defesa>
Os advogados de defesa, de uma forma geral, afirmam que Gonet não apresentou uma prova documental sequer que coloque seus clientes no cenário dos crimes praticados em 8 de janeiro de 2023. Para eles, o fato do procurador não ter indicado o ato específico de dano praticado diretamente contra os prédios públicos impede que os réus sejam culpados pelos acontecimentos daquele dia.>
A equipe de advogados de Bolsonaro, por exemplo, afirma que a narrativa do PGR trata de um “golpe imaginado”, e que mesmo que o ex-presidente tenha cogitado, numa espécie de “brainstorm”, algum tipo de ruptura institucional, a PGR não trouxe aos autos nenhuma prova cabal que ligue Bolsonaro aos atos antidemocráticos de 8 de janeiro.>
Os réus do núcleo 1 da trama golpista, que serão julgados a partir desta terça-feira:>
Jair Bolsonaro - ex-presidente da República;>
Alexandre Ramagem - ex-diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin);>
Almir Garnier- ex-comandante da Marinha;>
Anderson Torres - ex-ministro da Justiça e ex-secretário de Segurança do Distrito Federal;>
Augusto Heleno - ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI);>
Paulo Sérgio Nogueira - ex-ministro da Defesa;>
Walter Braga Netto - ex-ministro de Bolsonaro e candidato à vice na chapa de 2022;>
Mauro Cid – ex-ajudante de Ordens de Bolsonaro.>