Investigado por fraudes no ENEM é denunciado por pornografia infantil, no Pará

André Ataíde foi denunciado pelo MPPA por produzir e armazenar conteúdos de pornografia envolvendo uma adolescente de 15 anos.

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Silmara Lima

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Publicado em 2 de agosto de 2025 às 16:45

André Rodrigues Ataíde foi denunciado pelo MPPA.
André Rodrigues Ataíde foi denunciado pelo MPPA. Crédito: Reprodução/Redes Sociais

O Ministério Público do Estado do Pará (MPPA) denunciou nesta quarta-feira (30), André Rodrigues Ataíde, de 25 anos, por produzir e armazenar conteúdos de pornografia envolvendo uma adolescente de 15 anos. O crime ocorreu em 2023 e a denúncia foi realizada pelo Juízo da Vara de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher do município de Marabá, no sudeste paraense. André é investigado na operação Passe Livre, da Polícia Civil, de combate a fraudes em vestibulares de medicina.

O inquérito entregue pela Polícia Federal à Delegacia Especializada no Atendimento à Criança e ao Adolescente (Deaca), relata que André “filmou, registrou e armazenou, por meio de mídia de vídeo, cena de sexo explícito ou pornográfica envolvendo a vítima (15 anos de idade à época dos fatos)”. O MPPA entende que tais condutas foram praticadas em contexto de violência doméstica e familiar contra a criança e o adolescente.

Conforme a denúncia, André manteve um relacionamento romântico com a adolescente durante o ano de 2023, quando ele tinha 23 anos. O inquérito diz que André teria pedido que ela lhe enviasse fotos íntimas e, também, gravou a relação sexual dos dois, posteriormente a enviando para a própria adolescente. Além disso, ele armazenava o conteúdo em seus aparelhos eletrônicos. Não há informações sobre o compartilhamento dos registros por André com outras pessoas.

Durante as investigações, a Polícia Federal constatou um aborto pelo qual a adolescente teria se submetido. Em uma das conversas analisadas pela PF, ela conta para André que está grávida e pede que ele adquira medicamentos abortivos. Outra troca de mensagens sugere que a garota tomou os comprimidos e concluiu o aborto.

Contudo, ao prestar depoimento à Deaca, a adolescente teria confessado que mentiu sobre a gravidez, com a intenção de convencer André a lhe pedir em namoro. Ela teria usado o teste de uma prima grávida para persuadi-lo. Por isso, e pela ausência de meios que comprovem que ela esteve ou não grávida naquele período, não há provas concretas que confirmem o crime de aborto. Ela também confirmou à polícia que sabia que o investigado registrava o ato sexual em vídeos e fotos.

A denúncia do MPPA explica ainda que André foi intimado para prestar esclarecimentos à polícia, mas se recusou. O promotor Jairo do Socorro dos Santos Costa pede que André seja citado para responder à ação penal e que, ao final do processo, seja condenado. Também solicita a fixação de indenização mínima por danos morais e a oitiva da vítima, que deverá prestar depoimento em juízo.

Ao ser procurada para um posicionamento, a defesa de André Ataíde por meio do advogado Diego Adriano Freires, que o defendeu no caso das fraudes no ENEM (Exame Nacional do Ensino Médio), conseguindo sua liberdade provisória, explicou que não defende mais os interesses de Ataíde e não sabe qual advogado o representa neste momento.

Sobre gravar momentos íntimos com menor de idade

O celular de André Ataíde, segundo a PF, continha imagens de sexo com a adolescente, tendo o caso sido remetido para a Polícia Civil, redundando na denúncia realizada pelo MPPA à Justiça Estadual.

O artigo 240 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) deixa claro, ao tipificar como crime produzir, fotografar, filmar ou registrar, por qualquer meio, cenas sexuais explícitas envolvendo criança ou adolescente, independentemente do consentimento de quem aparece. Ainda que a lei brasileira descriminalize relações sexuais consensuais com adolescentes a partir de 14 anos, essa autonomia não se aplica à gravação ou registro audiovisual de qualquer cena íntima.

Em suma, o estatuto diz que um adolescente ainda não tem maturidade para avaliar plenamente os riscos de uma exposição sexual registrada. Ele está em posição desigual frente ao adulto envolvido, e isso já é suficiente para invalidar qualquer suposto consentimento, ou seja, mesmo que o adolescente consinta — ou emocionalmente concorde em — ser filmado ou fotografado, a lei não o reconhece como capaz de autorizar esse tipo de exposição íntima. O fundamento está na proteção de sua vulnerabilidade, seja emocional, social, psicológica ou legal.

É importante frisar que não se trata de uma escolha pessoal: trata-se do registro da intimidade sexual, o que, no entendimento do ECA, é uma violação do direito à dignidade do menor. Por isso, o adulto que grava essa cena pode responder por crime, com pena de 4 a 8 anos de reclusão e multa, sem considerar o consentimento dado pelo adolescente ou até pelos pais.

Fraudes no ENEM

Em fevereiro de 2024, a Polícia Federal deflagrou a operação Passe Livre, para combater a fraudes no Enem. O estudante de medicina André Rodrigues Ataíde, era suspeito de ter sido aprovado duas vezes no exame (para o curso de medicina), se passando por outras duas pessoas. Com base na nota no Enem conseguida através de fraude, essas duas pessoas foram aprovadas em medicina, pela Universidade Estadual do Pará (Uepa) em Marabá, mas sem terem feito a prova.

A perícia da Polícia Federal constatou que as assinaturas nos cartões de resposta e as redações não foram produzidas pelos inscritos nos processos seletivos do Enem. Para se passar por outros candidatos, André pode ter usado documentos falsos. Os três foram alvos de mandados de busca e apreensão à época. Nas casas dos investigados foram apreendidos telefones celulares, provas do Enem de 2019 a 2023 e manuscritos.

André se especializou em burlar o controle de exames de admissão online de algumas faculdades privadas. Essas provas costumam ser feitas com o microfone e câmera do computador ligados, para que um fiscal observe se o candidato não está colando.

A Polícia Federal identificou 30 candidatos que contrataram os serviços de André em quatro estados para 107 provas de vestibular. A PF cumpriu 27 mandados de busca em casas de candidatos suspeitos ou de cúmplices no esquema de fraudes. O investigado contava com um time de 32 pessoas fazendo as provas ou transmitindo as respostas para os candidatos, segundo a PF.

"Ele chegou a realizar nove provas em um único dia, simultaneamente, para nove candidatos. Ele tinha colaboradores que auxiliavam na resolução das provas", explica o delegado da Polícia federal Ezequias Martins.

Em fevereiro deste ano, o Fantástico mostrou a prisão de André por ter feito presencialmente, pelo menos, duas provas do Enem no lugar de estudantes que pagaram pelo serviço. A fraude foi comprovada quando a assinatura de André e a letra da redação foram comparadas com a assinatura e a letra dos estudantes aprovados. Um deles já estava cursando medicina na Universidade Estadual do Pará, a Uepa, onde André também estudava.

André hoje é réu na Justiça federal e responde em liberdade. E ainda pode se tornar réu em outro processo na Justiça estadual do Pará pelos mesmos crimes. Em abril, André cancelou a matrícula na Universidade do Estado do Pará, onde já estava em andamento um processo de expulsão. Ele continuou a cursar medicina em Marabá na Faculdade de Ciências Médicas do Pará, a Facimpa.