Publicado em 3 de outubro de 2025 às 07:41
O Ministério Público Federal (MPF) vem atuando judicialmente, desde dezembro de 2024, para ser decretada a suspensão imediata de todas as atividades de pesquisa mineral e de lavra de minérios sem a devida e prévia autorização ambiental do órgão gestor da unidade de conservação na Área de Proteção Ambiental (APA) do Tapajós, no sudoeste do Pará.>
A iniciativa alerta para um cenário de descontrole e ilegalidade que ameaça a integridade de uma das mais importantes unidades de conservação da Amazônia, ressaltando a relevância do caso no contexto dos debates da 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP30).>
A ação visa combater a concessão sistemática de permissões de pesquisa e lavra mineral pela Agência Nacional de Mineração (ANM) sem a autorização prévia e obrigatória do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), órgão gestor da APA. No processo, o MPF pede à Justiça Federal que obrigue a agência reguladora a suspender todas as autorizações de pesquisa e permissões de lavra irregulares, bem como que a proíba de emitir novas sem a anuência prévia e inequívoca do ICMBio. Adicionalmente, busca a condenação da ANM ao pagamento de uma indenização de R$ 100 milhões por danos morais coletivos.>
O problema foi identificado após o próprio ICMBio apresentar, em um evento da Câmara de Meio Ambiente e Patrimônio Cultural (4CCR) do MPF realizado em novembro de 2024 em Belém, a situação alarmante das permissões concedidas à revelia do órgão. Em menos de 30 dias, o MPF formalizou a denúncia na Justiça.>
O principal objetivo da ação é frear a degradação ambiental causada por uma mineração que, embora formalmente autorizada pela ANM, opera, na prática, desrespeitando a legislação. A Lei 7.805/1989 exige a anuência do órgão gestor de unidades de conservação para a realização de pesquisa e de lavra e minérios.>
Gravidade da situação>
Ainda não há uma decisão judicial sobre os pedidos do MPF. No entanto, a ação já expôs a dimensão alarmante do problema. Uma informação técnica do ICMBio anexada ao processo revelou que a agência descobriu a existência de 828 permissões de lavra garimpeira ativas na APA, concedidas pela ANM, sobre as quais o instituto sequer havia sido notificado.>
Paralelamente, uma fiscalização do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), que resultou na suspensão cautelar de 331 permissões no final de 2024, constatou a realidade em campo: uso indiscriminado de mercúrio, despejo de rejeitos diretamente nos rios e mineração em áreas de preservação permanente. Em relatório, o Ibama foi taxativo ao afirmar que a atividade garimpeira “licenciada” na APA do Tapajós “não difere em nada da atividade realizada nos garimpos completamente ilegais”.>
A liderança indígena Valdineia Saw Munduruku, que integra o conselho consultivo da APA, aponta que o garimpo ilegal provocou uma série de impactos nocivos ao território indígena Munduruku, tanto na área ambiental quanto na social. “Os invasores já mataram muitos indígenas, além de trazerem para dentro do território doenças, bebidas e drogas”, relata.>
Ela também destaca o assoreamento de rios e o desmatamento provocado pela mineração ilegal, e alerta que o principal impacto tem sido o aumento da contaminação de indígenas por mercúrio, o que foi comprovado por pesquisas da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), instituição ligada ao Ministério da Saúde.>
Direitos fundamentais>
Foto aérea de mineração na APA Tapajós, no ParáCom essa atuação, o MPF protege diversos direitos, como o direito a um meio ambiente ecologicamente equilibrado, a proteção da biodiversidade e a garantia da saúde e do modo de vida de populações indígenas e tradicionais. A contaminação dos rios da Bacia do Tapajós por mercúrio afeta diretamente a subsistência e a saúde do povo Munduruku, cuja terra indígena é vizinha à APA.>
Para o procurador da República Gilberto Batista Naves Filho, a ação é um exemplo prático dos desafios que serão debatidos na COP30. “É necessária a observância da legislação, não podendo o órgão gestor da unidade de conservação ser simplesmente desconsiderado”, avalia o membro do MPF.>
Segundo ele, a atuação do MPF busca restabelecer a legalidade, com a devida necessidade de anuência do órgão gestor da área de proteção ambiental do Tapajós como condição necessária e indispensável para a autorização de pesquisas e de lavra de minérios na unidade de conservação federal.>