Publicado em 7 de outubro de 2025 às 16:33
Como bom noveleiro, acompanhei, mesmo aos trancos e barrancos, o remake de “Vale Tudo” e posso afirmar: 37 anos após sua estreia, o clássico segue sendo um retrato contundente da sociedade brasileira. A tão aguardada cena da morte de Odete Roitman, exibida no capítulo desta segunda-feira (6), merecia ser revivida como um dos grandes momentos da teledramaturgia nacional, mas ficou abaixo das expectativas.>
No remake de Manuela Dias, cinco suspeitos entraram no famoso Copacabana Palace portando armas e, muitas vezes, exibindo-as, algo que, convenhamos, qualquer sistema de segurança impediria de acontecer. Quem conhece os contos de Agatha Christie deve ter gargalhado com as cenas superficiais que antecederam o disparo trágico. Não foi uma morte que fez o telespectador vibrar como em 1988, quando Odete cai ensanguentada em um corredor de apartamento, debaixo de um quadro. Ali havia uma aura de mistério, comoção e uma pitada de romance policial.>
Expectativas à parte, o ponto alto da novela é a atuação da fabulosa Débora Bloch, que, diga-se de passagem, fez o Brasil amar a nova versão de Odete Roitman. Ela pode ter sido má, preconceituosa, elitista e tudo mais, mas carregou o remake nas costas e caiu nas graças do público. Foi um dos grandes acertos da nova versão e coroou a trajetória de Bloch como uma das maiores atrizes do país.>
Voltando ao clímax do novelão, a autora nos mostrou que tia Celina, Leila, Marco Aurélio, Heleninha, César e Maria de Fátima são os principais suspeitos pela morte da empresária. A identidade do assassino (ou assassina) só será revelada no último capítulo. Até lá, teremos que nos contentar com o desenrolar da trama nos próximos dias.>
Se a autora quiser seguir o óbvio, todos os suspeitos têm motivos suficientes para matar a grande vilã. Mas, se quiser inovar, não seria surpresa se Odete tivesse planejado a própria morte, com ajuda de seus novos e fiéis escudeiros, Freitas e Consuelo. Se você, leitor, analisar bem, o capítulo de ontem deu algumas pistas sobre essa teoria… ou Manuela Dias apenas usou uma artimanha para nos confundir? Ok, confesso: essa é uma teoria pessoal deste jornalista!>
Mais do que o impacto da morte de Odete, “Vale Tudo” se destacou pela coragem de abordar a crise de valores do país. Empresários corruptos, políticos oportunistas e cidadãos tentando “levar vantagem em tudo” ainda compõem um painel realista, que incomoda e fascina o público. O próprio Gilberto Braga, autor da trama original, afirmou em diversas entrevistas que a novela era sobre “um país que ainda não sabia o que fazer com a liberdade”. Ele se referia ao momento de redemocratização que o Brasil vivia à época.>
Mesmo com falhas, o remake de “Vale Tudo” termina como um sucesso absoluto. É só observar os números de faturamento comercial da emissora e o burburinho nas redes sociais. O texto afiado, o elenco marcante e a direção precisa transformaram a obra em um novelão gostoso de assistir.>
A produção continuará sendo lembrada por provocar um debate que atravessa gerações, e que talvez explique sua permanência no imaginário nacional. No fim das contas, a pergunta lançada por Gilberto Braga em 1988 segue vivíssima, sem resposta definitiva: afinal, vale a pena ser honesto no Brasil?>
Por Bruno Magno, jornalista, noveleiro, e amante de cinema.>