Freira brasileira denuncia ter sido afastada de alto cargo na igreja por ser ‘bonita demais’

Irmã Aline foi denunciada ao papa Francisco por um frei da ordem de seu mosteiro; "me expôs ao ridículo"

Publicado em 12 de maio de 2025 às 15:55

Aline Pereira Ghammachi era madre-abadessa do Mosteiro San Giacomo di Veglia.
Aline Pereira Ghammachi era madre-abadessa do Mosteiro San Giacomo di Veglia. Crédito: Divulgação. 

Uma freira brasileira está denunciando na mídia internacional que desde a morte do papa Francisco vem lutando para ter de volta seu alto cargo na igreja Católica, após ter sido denunciada ao papa, em uma carta anônima.

Aline Pereira Ghammachi era madre-abadessa do Mosteiro San Giacomo di Veglia, uma construção de pedra centenária que fica perto de Veneza. Nascida no Amapá, a brasileira é formada em administração de empresas, e dedicou sua vida à religião. Ela foi tradutora de documentos sigilosos e intérprete de eventos da Igreja, até que, em fevereiro de 2018, foi indicada para chefiar o mosteiro, quando tinha 33 anos, sendo a madre-abadessa mais jovem da Itália.

A frente da casa religiosa, irmã Aline atuava ao lado de mais de 20 religiosas, que durante sua administração, abriram as portas para a comunidade com projetos como hortas comunitárias e plantação de uvas, além de oferecer auxílio para mulheres vítimas de violência e pessoas com autismo.

Mas há dois, o trabalho de Aline no mosteiro foi abalado por uma denúncia contra ela enviada ao papa Francisco , através de uma carta anônima. Segundo a denúncia, Aline manipulava outras freiras e ocultava o orçamento do mosteiro.

A carta chegou até o papa e a igreja começou uma auditoria do mosteiro. A primeira inspeção foi em 2023 e durou semanas, mas sugeriu-se que o caso fosse arquivado. Porém, o caso foi reaberto meses depois.

“Acredito que tenha sido a pedido de frei Mauro Giuseppe Lepori”, diz a freira. Lepori é abade-chefe da ordem que dirige o mosteiro, e Aline havia trabalhado com ele por anos. “Ele dizia que eu era bonita demais para ser abadessa, ou mesmo para ser freira. Falava em tom de piada, rindo, mas me expôs ao ridículo”, contou ela à imprensa.

Segundo a freira, em 2024, o Vaticano mandou outra visitadora apostólica até o mosteiro. “Ela não fez nenhum teste conosco, não fez absolutamente nada, apenas teve uma conversa. E chegou à conclusão de que eu era uma pessoa desequilibrada e que as irmãs tinham medo de mim.”

Quase um ano depois da visita, enquanto o papa Francisco se encontrava enfermo, a irmã Aline foi informada da decisão que tirou seu cargo. Uma nova abadessa assumiria a comunidade.

A irmã denuncia que a nova abadessa, de 81 anos, chegou no dia da morte do papa argentino, dizendo ter ido até lá em nome dele. “Isso aconteceu num dia de luto para a Igreja, e num dia em que nós não poderíamos recorrer a ninguém. Chega essa comissária e se diz representante de uma pessoa que não existe mais.”

Aline afirma que foi mandada embora do mosteiro e para ficar isolada em outra comunidade católica, para buscar “fazer um caminho de amadurecimento psicológico”, mas ela contestou. “Primeiro, porque eu não sabia a razão de ter sido mandada embora do mosteiro. E segundo porque não existiu uma denúncia formal ou um julgamento”, diz a freira.

Após a irmã ir embora do mosteiro, outras 11 freiras deixaram do local. Cinco delas fugiram um dia depois, sem levar nada, e foram até uma delegacia de polícia da cidade. “As que ficaram são as irmãs anciãs, de 85 anos, 88 anos”, diz a brasileira.

Uma das freiras que fugiu, concedeu entrevista à imprensa e saiu em defesa de Aline. “Foi inaugurado um tratamento medieval, um clima de calúnias e acusações infundadas contra a irmã Aline que, por sua vez, é uma pessoa muito séria e escrupulosa e que nos últimos anos se tornou o ponto de referência para a comunidade”, disse a freira Maria Paola Dal Zotto ao jornal Gazzettino.

O frei Mauro Giuseppe Lepori, acusado de encaminhar a denúncia sobre a brasileira, e dizer que ela era bonita demais para ser abadessa, afirmou a um jornal local que “a ex-abadessa está se libertando, acreditando que pode recuperar o poder e a vaidade por meio de mentiras e manipulação da mídia”.

A Igreja não se pronunciou sobre o caso que está sendo levado ao Supremo Tribunal da Assinatura Apostólica.

“Eu não tive direito de defesa. Fui colocada para fora do mosteiro, sem motivação. Estamos até recorrendo ao Supremo Tribunal da Assinatura Apostólica. Por que aconteceu? Porque eu sou mulher, porque eu sou jovem e porque, principalmente nesse contexto, sou brasileira. Aí mostra a questão sexista, machista. Porque uma pessoa jovem e bonita deve ser burra. Não pode ser inteligente, tem que ficar calada”, desabafou a religiosa.