Dirceu diz receber com 'tranquilidade' anulação de condenações assinadas por Moro na Lava Jato

A decisão do ministro em um habeas corpus da defesa do petista, estende os efeitos da suspeição do ex-juiz, hoje senador pelo União Brasil do Paraná, aos processos que envolvem Dirceu.

Publicado em 29 de outubro de 2024 às 11:06

José Dirceu diz receber com 'tranquilidade' anulação de condenações assinadas por Moro na Operação Lava Jato.
José Dirceu diz receber com 'tranquilidade' anulação de condenações assinadas por Moro na Operação Lava Jato. Crédito: Agência Brasil

O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes, anulou nesta segunda-feira, 28, todos os atos processuais do ex-juiz Sérgio Moro contra o ex-ministro da Casa Civil, José Dirceu no âmbito da Operação Lava Jato. Após a anulação das condenações, José Dirceu disse, em nota, que “sempre confiou na Justiça”. Em nota divulgada pela defesa do ex-ministro, a cargo do advogado Roberto Podval, Dirceu afirmou ter recebido a decisão “com tranquilidade”. 

“A decisão, que restitui seus direitos políticos, entende que os processos contra Dirceu tinham por objetivo real atingir o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o que demonstra a quebra de parcialidade das ações”, afirmou.

 A decisão do ministro em um habeas corpus da defesa do petista, estende os efeitos da suspeição do ex-juiz, hoje senador pelo União Brasil do Paraná, aos processos que envolvem Dirceu.

Em maio, a Segunda Turma do STF extinguiu uma pena de 8 anos e 10 meses imposta pela Justiça Federal do Paraná a José Dirceu. O processo julgado pela Turma envolvia uma condenação por supostas propinas da empresa de tubulação Apolo Tubulars, entre os anos de 2009 e 2012, para ajudar a corporação a fechar contratos com a Petrobras. Segundo a condenação, José Dirceu teria usado sua influência para manter Renato Duque na Diretoria de Serviços da estatal e, com isso, direcionar licitações à empresa de tubulação.

Três dos cinco ministros da Segunda Turma consideraram a condenação inválida do ponto de vista processual, seguindo um entendimento de que o crime do réu teria sido consumado no momento do suposto pedido de propina. Com isso, o ano de prescrição foi marcado para 2009. Como José Dirceu só foi condenado em 2017, a sentença foi considerada irregular.

Na ocasião, formaram maioria para anular a pena de José Dirceu os ministros Kassio Nunes Marques, Ricardo Lewandowski (hoje, ministro da Justiça) e Gilmar Mendes, que decidiu anular os demais processos envolvendo o ex-ministro nesta segunda.

José Dirceu foi ministro-chefe da Casa Civil durante o primeiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), deixando o cargo na esteira do escândalo do mensalão. O ex-deputado federal planeja um retorno à vida pública nas eleições gerais de 2026.

A reversão universal das condenações a José Dirceu se soma a uma série de decisões da Lava Jato anuladas pelo STF. A força-tarefa, no seu auge, foi considerada a maior mobilização judicial do País contra políticos suspeitos de desvios de recursos públicos. Em 2024, contudo, a operação completa dez anos de existência em frangalhos.

Sobretudo nos últimos anos, a Lava Jato acumula reveses às decisões de primeira instância e muitos acusados vêm obtendo vitórias nas Cortes superiores, como os Tribunais Regionais Federais (TRFs) e o STF.

As absolvições, muitas vezes, se valem de questões processuais e não versam necessariamente sobre o mérito da denúncia. Se a tipificação do crime estiver incorreta, o processo é anulado. Da mesma forma, se as provas que baseiam determinada sentença forem anuladas, o processo conseguinte deixa de ser válido.

Relembre as condenações da Lava Jato anuladas pelo STF

Em fevereiro, o ministro do STF Edson Fachin anulou as condenações do ex-tesoureiro do PT João Vaccari Neto e dos marqueteiros João Santana e Mônica Moura. Eles haviam sido denunciados pela Lava Jato pelo suposto recebimento de caixa dois para o PT nas eleições de 2010. Na avaliação de Fachin, o processo deveria ter tramitado na Justiça Eleitoral do Distrito Federal, e não na 13ª Vara Federal de Curitiba.

No ano passado, sob relatoria do ministro Cristiano Zanin, o STF anulou a condenação do ex-deputado federal André Vargas por razões processuais, baseando-se em uma resolução anterior do colegiado. A Corte havia decidido que a 13ª Vara Federal de Curitiba só podia julgar e condenar atos ilícitos no âmbito da Petrobras, tornando improcedente a condenação de André Vargas naquele local.

Vargas foi o primeiro político condenado pela Lava Jato. Em setembro de 2015, o ex-juiz Sérgio Moro condenou o parlamentar pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Somadas, as penas passavam dos 15 anos de prisão.

Também em 2023, o ministro Dias Toffoli determinou a "nulidade absoluta" de todos os atos praticados pela Lava Jato contra o ex-governador do Paraná Beto Richa (PSDB), atualmente deputado federal. A decisão do ministro acatou um pedido da defesa de Richa que alegava vícios processuais. Segundo os advogados do parlamentar, e assim entendido por Toffoli, os procuradores Deltan Dallagnol e Diogo Castor de Mattos, além do juiz Sérgio Moro haviam agido de forma "parcial".

O maior dos reveses da Lava Jato no STF teve origem em um inquérito que acusava Eduardo Paes (PSD), atual prefeito do Rio de Janeiro, de lavagem de dinheiro e caixa dois durante a campanha à prefeitura carioca em 2012. Em 2019, a questão chegou ao Supremo.

A decisão da Corte gerou um "efeito cascata" desastroso para a Lava Jato, pois o STF decidiu que a prática de caixa dois é de competência exclusiva da Justiça Eleitoral. Dessa forma, a Justiça Federal, na qual tramitavam os processos da força-tarefa, foi demovida de todas as acusações do gênero.

Foi esse o precedente que abriu margem para a anulação do processo contra o ex-deputado federal Eduardo Cunha (PRD), que havia sido condenado a 15 anos de prisão pelos crimes de corrupção e lavagem de dinheiro. Cunha foi julgado pela 13ª Vara Federal de Curitiba, mas o STF foi acionado para julgar a competência do caso. Em maio de 2023, por 3 votos a 2, a Segunda Turma da Corte entendeu que, na verdade, o ex-presidente da Câmara dos Deputados deveria ter sido processado na Justiça Eleitoral.