Publicado em 8 de setembro de 2025 às 11:02
Jovens de diferentes países do continente africano participaram em Adis Abeba, capital da Etiópia, do Balanço Ético Global da Juventude, em preparação para a COP30, como parte das agendas da Semana do Clima da ONU na África, neste sábado (9). O evento reuniu representantes da COP29, do PNUD (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento); do UNICEF (Fundo das Nações Unidas para a Infância); organizações da sociedade civil, delegações e pessoas que atuam em áreas relacionadas à mudança do clima em redes africanas e latino-americanas de juventude, em diálogo autogestionado sobre a participação jovem na Conferência no Brasil. >
A reunião, na sede da Comissão Econômica das Nações Unidas para a África, fortaleceu as vozes da juventude nos debates sobre os dilemas éticos da crise climática e dos acordos internacionais. O formato “autogestionado” permitiu que a sociedade civil – sejam estudantes, atletas, professores, movimentos sociais ou organizações comunitárias – organizasse suas próprias reuniões, produzisse reflexões e encaminhasse contribuições para o processo oficial da COP30.>
A brasileira Jovem Campeã do Clima da COP30, Marcele Oliveira, destacou a força e o protagonismo da juventude no debate do Balanço Ético Global. Segundo ela, o encontro em Adis Abeba, “berço da humanidade”, simboliza o papel essencial das novas gerações na construção de soluções para a crise climática. Ela avalia que o encontro na Etiópia expôs frustrações com a lentidão das negociações internacionais, mas também revelou caminhos concretos, como a mudança na governança global para incluir mais jovens, mulheres e pessoas com deficiência; uso da cultura e da comunicação como ferramentas de mobilização; a criação de empregos verdes e o fortalecimento da educação climática. Outro ponto central foi o financiamento. “A solução já existe nos territórios. O que falta é investimento justo e adequado para escalar o que já fazemos”, afirmou.>
Marcele também ressaltou o protagonismo da juventude africana, que, segundo ela, enfrenta desafios semelhantes aos da América Latina, mas demonstra grande capacidade de organização e inovação. “As juventudes africanas são líderes nesse processo. Precisamos que suas soluções ganhem visibilidade global”, declarou.>
Sobre a expectativa para a COP30, em Belém, Marcele defendeu que o encontro seja um marco para a justiça climática e para a transição da fase de discussões para a implementação. “Chega de conversa, é hora de fazer. A COP30 precisa ser lembrada como um ponto de virada em que a educação, a visibilidade e as oportunidades climáticas foram impulsionadas de forma concreta”, concluiu.>
A agenda na África foi considerada de peso simbólico especial, pois além de reunir jovens de diferentes países, trouxe uma forte presença africana em um momento em que o continente clama por justiça climática. O debate em Adis Abeba foi guiado por doi questionamentos centrais:>
Reflexões sobre os dilemas atuais>
Jovens líderes do clima de diferentes países apresentaram análises sobre os dilemas da crise climática e propostas concretas para soluções, evidenciando a urgência de ações justas e inclusivas. Durante o debate, eles refletiram sobre por que frequentemente a ciência e os saberes tradicionais sobre o clima são ignorados ou negados pelas populações do mundo. Entre as propostas discutidas estavam empregos verdes, estratégias de adaptação, integração entre clima e segurança, e comunicação efetiva para combater a desinformação.>
Elliot Itua Osemudiame, do Instituto Africano de Economia Verde e Sustentabilidade, apontou que em contextos de conflito, violência e migração, prioridades como educação, paz e segurança muitas vezes se sobrepõem às questões climáticas. Em países como Sudão, Palestina, Congo, Ucrânia e Haiti, milhões de crianças ficaram fora da escola devido a crises humanitárias, mostrando que os impactos climáticos se somam a desafios estruturais graves.>
Os participantes reforçaram que o financiamento climático deve ser justo, previsível e acessível, focado em soluções locais e na resiliência das comunidades vulneráveis. O objetivo tanto prover recursos como implementar e escalar práticas que já funcionam nos territórios, garantindo que as soluções sejam efetivas e centradas na realidade das populações.>
Além disso, os jovens defenderam a necessidade de mudança na governança global, tornando os processos mais inclusivos para mulheres, pessoas com deficiência, jovens e comunidades tradicionais. Mesene Kessy Smeralda, defensora jovem do clima do UNICEF, do Gabão, ressaltou a importância de integrar saberes ancestrais e locais, valorizando o conhecimento de territórios historicamente marginalizados, como favelas e áreas rurais, e destacou a educação climática e o uso de cultura e tecnologia como ferramentas essenciais de mobilização.>
Para a etíope Siham Ahmed, da organização EcoJustice Etiópia, discutir a crise climática sem ouvir a juventude é ignorar a maioria da população do continente. “Mais de 70% da população da Etiópia é jovem, e o mesmo acontece em toda a África, onde mais da metade das pessoas têm menos de 30 anos. Excluir essas vozes das decisões significa negar a realidade demográfica dos nossos países”, afirmou durante o Balanço Ético Global da Juventude.>
A ativista destacou que, em sua pesquisa sobre o papel das crianças e jovens na política climática etíope, muitos relataram sentir que sua opinião não importa. Mesmo quando convidados a reuniões, acreditam que suas falas não influenciam nas decisões, já que o governo acaba prevalecendo. Outro ponto crítico é a concentração dos debates somente nas grandes cidades. “A centralização dos debates nas grandes cidades reforça a exclusão daqueles que vivem fora dos grandes centros”, explicou.>
Conforme Siham Ahmed, além da questão geográfica, há barreiras de linguagem. Grande parte das discussões utiliza termos técnicos e em inglês, sem tradução adequada para línguas locais, o que limita a compreensão e reduz a participação efetiva dos jovens. Para ela, adaptar a linguagem é essencial para tornar o debate mais inclusivo.>
A EcoJustice Etiópia tem defendido que as novas Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs), que o país deve submeter em setembro, tragam de fato a perspectiva da juventude. Siham também fez um apelo em relação à COP30, que será realizada em Belém, no Brasil. Para ela, o encontro deve marcar uma virada em que as vozes jovens sejam não apenas ouvidas, mas incorporadas nos processos de decisão. “Se mais da metade da população é jovem, uma política que não inclui suas vozes não pode ser considerada representativa”, alertou.>
Wanjira Mathai
co-líder do Balanço Ético GlobalA ambientalista queniana co-líder do Balanço Ético Global, Wanjira Mathai, defendeu que a juventude deve ser reconhecida não apenas como promessa para o futuro, mas como liderança ativa no presente. Para ela, o engajamento jovem é decisivo porque são justamente as novas gerações que enfrentarão os impactos mais severos da crise climática. “Não podemos tratá-los apenas como uma categoria social. Eles são líderes agora. Precisamos deles para construir um legado de justiça, de transparência e de ação real diante da crise climática”, afirmou,>
A co-líder lembrou que, ao longo dos diálogos regionais do Balanço Ético Global, a presença jovem tem se mostrado essencial para dar legitimidade às discussões. “Eles querem ser ouvidos, e têm o direito de estar no centro das decisões. Quando a juventude africana falou aqui, todos ouviram. Não é fácil, mas é indispensável que sejam incorporados nas políticas climáticas”, acrescentou.>
O Balanço Ético Global é um dos círculos criados pela presidência brasileira da COP30 para aproximar lideranças globais de diferentes setores. Além dos diálogos regionais — como os que ocorreram nesta semana em Adis Abeba — os encontros autogestionados são uma peça central dessa estratégia. Qualquer pessoa, organização ou movimento social pode organizar o seu próprio debate, seguindo o guia disponível no site oficial da COP30 (em português, inglês e espanhol) e registrando os resultados na plataforma Brasil Participativo.>