"Guardiões da biodiversidade": Brasil articula maior participação indígena da história das COPs

Estimativa é que cerca de três mil integrantes de povos originários estejam presentes em Belém, sendo mil participantes das negociações oficiais; governo brasileiro encabeça iniciativas para viabilizar presença de indígenas de todo o mundo

Publicado em 9 de agosto de 2025 às 14:47

Ministério dos Povos Indígenas realiza curso e encontros com comunidades e articula participação de povos de outros países
Ministério dos Povos Indígenas realiza curso e encontros com comunidades e articula participação de povos de outros países Crédito: Rafael Medelima / COP30

A COP30, que será realizada em Belém (PA), deve ter a maior participação de povos indígenas da história. É esta a previsão do governo brasileiro, que preside a COP30 em 2025. De acordo com a ministra dos Povos Indígenas do Brasil, Sonia Guajajara, cerca de três mil membros de povos originários de todo o mundo devem estar presentes nos debates na COP, em novembro deste ano. Desse total, mil devem participar das negociações oficiais, dentro da Zona Azul: 500 brasileiros e 500 de outros países. Os outros devem circular pela Zona Verde, que comporta os observadores da sociedade civil.

A meta da presidência brasileira é viabilizar a mais ampla participação dos "guardiões da biodiversidade" de todas as conferências, como são chamados os povos indígenas e comunidades tradicionais pelo secretário-geral da ONU, António Guterres. Neste 9 de agosto, estas populações são celebradas pelo Dia Internacional dos Povos Indígenas, instituído pela Organização das Nações Unidas.

O recorde de participação atual foi registrado em Paris, em 2015, e em Dubai, em 2023, quando foram registrados 350 integrantes de povos originários.

"Estamos muito confiantes, otimistas, articulando para que a gente tenha não só a maior delegação em quantidade, mas também em qualidade na participação"

— Sonia Guajajara, ministra dos Povos Indígenas do Brasil

Articulação

Para alcançar o recorde de participação indígena, a Presidência da COP30 criou o Círculo dos Povos, presidido pela ministra, que visa aumentar a capacidade de escuta de demandas e contribuições de povos indígenas, comunidades tradicionais e afrodescendentes. O círculo está em diálogo com populações originárias de todo o mundo, por meio do Caucus Indígena — representação indígena oficial na UNFCCC — para que a COP30 tenha a maior delegação da história.

Em âmbito nacional, o Ministério dos Povos Indígenas (MPI) e a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) promovem o Ciclo COParente, com o intuito de conscientizar as populações originárias sobre a conferência e contribuir para a preparação das lideranças. Trata-se de uma série de encontros em todas as regiões do Brasil para apresentar às comunidades o funcionamento da conferência do clima e abordar as pautas que serão discutidas no evento. O nome da iniciativa traz um termo comumente utilizado pelos indígenas para falar de seus pares, os "parentes".

Já foram realizadas etapas na região Amazônia, em Belém (PA), e nos biomas Caatinga, Pampa, Mata Atlântica, Cerrado e Pantanal, nos estados de Santa Catarina, Pernambuco, São Paulo, Mato Grosso do Sul, Rondônia, Acre e Maranhão. Os últimos encontros serão em Roraima, Amapá, Amazonas e Mato Grosso.

Paralelamente, o MPI conduz o Programa Kuntari Katu, curso que forma lideranças indígenas para atuar nas complexas negociações climáticas internacionais, em parceria com o Itamaraty e o Instituto Rio Branco.

Além disso, o espaço para receber os três mil indígenas em Belém já está garantido. O governo brasileiro está organizando uma "Aldeia COP" na Universidade Federal do Pará (UFPA) que comportará um acampamento para este público.

O presidente da COP, embaixador André Corrêa do Lago, reforça que a participação destes povos é uma prioridade da presidência brasileira. "É extremamente importante que nós possamos envolver vários grupos que já foram muito marginalizados na evolução da economia e da política mundial, como povos indígenas, afrodescendentes e outros grupos na preparação da Conferência".

Pauta central

Sonia Guajajara destaca que os povos originários de todo o planeta têm, em comum, a defesa da garantia ao território. De acordo com ela, um dos caminhos para isso é a inclusão da proteção das terras nas Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs) assumidas pelos países para alcançar a meta global de redução de gases que contribuem para o efeito estufa. A demanda converge com o enfrentamento às mudanças do clima, uma vez que as terras indígenas guardam algumas das zonas mais preservadas do planeta, atuando como "sumidouros de carbono".

"Nós trazemos a pauta da demarcação das terras como uma das medidas eficazes para o enfrentamento à crise climática, e os territórios como uma das formas de mitigar essa crise", frisou a ministra.

A titular do MPI lembrou ainda que, desde 2015, no Acordo de Paris, os países signatários já compreendem formalmente a importância das terras de povos originários no contexto do clima. "Já há uma constatação que os territórios indígenas contribuem significativamente para esse equilíbrio do clima. O território é protegido pela relação, pelo modo de vida dos povos indígenas. Portanto, a gente conecta ali o nosso direito à garantia territorial com toda essa agenda de ação para o alcance das metas assumidas pelos países", explicou.

Na COP30, o MPI defenderá também que povos indígenas e comunidades tradicionais recebam no mínimo 20% dos Fundo Florestas Tropicais para Sempre (TFFF, na sigla em inglês), que tem sido debatido em âmbito internacional por iniciativa do governo brasileiro. Segundo a titular da pasta, apenas 1% de todos os recursos que são tradicionalmente mobilizados para a mudança do clima chega aos territórios indígenas.