Publicado em 13 de outubro de 2025 às 11:26
Ele usa coroa (de folhas do açaizeiro) e tem nome de rei. A vida nobre de Charles, porém, não tem relação alguma com monarquias, mas com a transformação radical que estabeleceu com a floresta amazônica.>
Antigo derrubador de árvores, ele aposentou a motosserra e virou símbolo de turismo sustentável na Ilha do Combu, em Belém. Gerson Tadeu Teles, nome oficial de Charles, fundou o Ygara Artesanal, projeto de imersão na floresta em que turistas vivenciam rituais ancestrais, trilhas e banhos de cheiro com ervas medicinais.>
“Eu cresci aqui, vendo o quanto a floresta nos dá e o quanto ela precisa ser respeitada. Quando comecei a receber visitantes, entendi que poderia gerar renda sem destruir, mostrando para as pessoas a riqueza da natureza”, diz Charles.>
Em média, o Ygara recebe até 50 pessoas semanalmente, o que pode aumentar nos períodos de férias e feriados. Além das trilhas ecológicas e passeios fluviais, o negócio de Charles inclui a venda de produtos regionais, como artesanato e doces feitos com frutas nativas. A renda extra impacta sua família e inspira outros moradores da ilha.>
“Hoje, tenho orgulho de mostrar onde vivo. O turismo sustentável me fez entender que cuidar da floresta é também cuidar da nossa própria sobrevivência”, diz o empreendedor.>
O projeto Ygara Artesanal é administrado em parceria com agências de viagens, a Cooperativa de Transporte do Combu, parceiros com foco em pequenos negócios sustentáveis e o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae).>
De acordo com o diretor-superintendente do Sebrae no Pará, Rubens Magno, iniciativas como a de Charles mostram que a bioeconomia é uma alternativa concreta de desenvolvimento para a região.>
“O Sebrae acredita que fortalecer empreendedores locais é essencial para que a Amazônia cresça com base na sustentabilidade e na valorização da cultura de seu povo”, diz Magno. “Em 2019, eram cerca de um ou dois empreendedores formalizados. Hoje, esse número é de quase 80 empreendedores formalizados”.>
Nesta semana, o Sebrae e moradores locais, com o apoio da Agência Brasileira de Promoção Internacional do Turismo (Embratur), inauguram a Rota Combu. O objetivo é oferecer turismo de base comunitária na região, que valorize a cultura ribeirinha, o ecoturismo e o empreendedorismo local.>
O projeto começa com a participação de 14 empreendimentos. Há negócios de agroecologia, fabricação de artesanatos, trilhas, quintais produtivos, hospedagem e vivências culturais.>
A preocupação com o meio ambiente é tida como central, principalmente quando Belém se prepara para receber a 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP30).>
“Hoje, já temos vários cursos para que os negócios trabalhem energias renováveis e consumam mais materiais que sejam reciclados. Estamos usando menos plástico, mais vidro, mais papel e, dessa forma, temos conseguido trabalhar realmente essa consciência ecológica dos nossos empreendedores”, diz Magno.>
Desafios>
Os investimentos em turismo, por enquanto, não têm sido acompanhados de investimentos significativos na melhoria de vida da população que vive e trabalha na Ilha do Combu.>
“Hoje, a gente sente muita falta de políticas públicas para o povo da floresta”, lamenta Charles.>
Os principais problemas, segundo o empreendedor, estão relacionados aos serviços precários, ou mesmo ausentes, de saneamento básico.>
“Temos uma coleta de lixo, mas ela ainda é precária. Nem sempre as pessoas conseguem fazer a coleta da maneira certa, porque não recebem orientação, nem estrutura adequadas”, acrescenta.>
“Não temos água potável na ilha, que é uma briga antiga. Precisamos comprar os garrafões de água mineral. Nossa sorte é que tem uma pessoa que passa aqui de barco vendendo. Mas o preço é muito caro pra gente, porque fazemos tudo com água mineral. Queria que isso mudasse até a COP, mas a gente não sabe se vai realmente mudar”.>