Dia do Índio x Dia dos Povos Indígenas: saiba como surgiu e porque mudou de nome

Hoje, 19 de abril, é comemorado o Dia dos Povos Indígenas. Para saber como surgiu a data, a mudança de nome e a importância para a sociedade, o Portal Roma News entrevistou Márcio Couto, professor do Programa de Pós-Graduação em História Social da Amazônia, da Universidade Federal do Pará (UFPA). A data surgiu em 1940...

Publicado em 26 de junho de 2024 às 09:38

Hoje, 19 de abril, é comemorado o Dia dos Povos Indígenas. Para saber como surgiu a data, a mudança de nome e a importância para a sociedade, o Portal Roma News entrevistou Márcio Couto, professor do Programa de Pós-Graduação em História Social da Amazônia, da Universidade Federal do Pará (UFPA).

A data surgiu em 1940 por ocasião do I Congresso Indigenista Interamericano, realizado na cidade de Pátzcuaro, no México, com o objetivo de debater assuntos relacionados às sociedades indígenas de cada país.

Na ocasião, foram convidados representantes de todos os países do continente americano, mas os indígenas se mostraram receosos em participar em razão do histórico de violências sofridas. Depois, mudaram de ideia e decidiram participar, o que motivou os congressistas a instituir o dia 19 de abril como o 'Dia do Índio'. Somente a partir de 1943, durante a presidência de Getúlio Vargas, o Brasil aderiu a essa determinação.

Mas, em 2022, um projeto de lei no Brasil mudou o nome para o Dia dos Povos Indígenas. A mudança do nome da celebração teve o objetivo de explicitar a diversidade das culturas dos povos originários. A alteração ocorreu com a aprovação do PL 5.466/2019, que revoga o Decreto-Lei 5.540, de 1943.

De acordo com Márcio, a palavra 'índio' é bastante genérica e remete a um tempo que essas populações eram vistas como atrasadas, selvagens e bárbaras. Remete a um tempo em que muitos brasileiros viam os povos indígenas como povos em extinção.

a palavra 'indígena', remete ao pertencimento desses povos a um determinado lugar, tem o significado de 'originário de'.

Márcio ressalta ainda que 'debater a cultura dos povos indígenas e sua influência na sociedade é uma forma de recuperar a importância desses sujeitos para a constituição do Brasil enquanto nação'.

'A diversidade cultural entre os povos indígenas é grande e é negada toda vez que nós os tratamos como ‘índios’, como se eles fossem todos iguais. É importante destacar que os indígenas são os legítimos donos de suas terras, que eles estão aqui há cerca de 11 mil anos. A Constituição brasileira de 1988 garante aos indígenas o direito a suas terras, ao seu modo particular de vida, à preservação de suas culturas', reforça.

Visão da sociedade

O professor da UFPA questiona como a data é vista pela sociedade. 'Essa data tem servido não para conscientizar os brasileiros sobre a diversidade e a riqueza cultural dos povos indígenas, mas reproduzir preconceitos, estereótipos e uma imagem generalizada acerca desses povos', afirma.

'Do modo como é ‘comemorado’, em nada contribui para a valorização dos povos indígenas. A cada ano, especialmente no Ensino Infantil, repete-se a imagem de um índio genérico, parado no tempo, tido como atrasado e vivendo no meio da floresta. Essa imagem de um indígena inocente, o 'indiozinho', não guarda nenhuma semelhança com a capacidade indígena de se atualizar ao longo do tempo. Por essa razão, as comunidades indígenas pressionaram o governo a mudar o 'Dia do Índio' para 'Dia dos povos indígenas', completa o professor de história.

Leis

Existe uma lei federal que determina a obrigatoriedade do ensino da história e da cultura indígena e afro-brasileira nas escolas de todo o país, a lei 11.645/2008.

No começo do mês, o estado do Pará criou a Secretaria de Estado dos Povos Indígenas do Pará (Sepi) visando consolidar as ações do governo frente às políticas públicas dos povos originários do Pará.

A mensagem que deve ser passada neste 19 de abril, de acordo com o professor Márcio Couto, é a de que os povos indígenas são, além de diferentes de nós, diferentes entre si.

'É fundamental apresentar os indígenas como povos do presente, como culturas que se transformam e se atualizam ao longo do tempo e que isso não significa que eles deixam de ser indígenas. Por isso, deve-se evitar, no ‘Dia dos povos indígenas’, a reprodução de atividades que reforçam esses estereótipos, tais como pintar as crianças com ‘pinturas indígenas’ genéricas ou vesti-las com adereços como cocares ou tangas igualmente genéricas'.

'Os indígenas estão em todos os espaços da sociedade brasileira. Muitos são médicos, advogados, professores. Muitos deles estão nas universidades.  Os povos indígenas não atrapalham o desenvolvimento do Brasil. Ao contrário disso, eles têm muitas lições a nos dar, especialmente no que diz respeito aos modos de preservação do meio ambiente. Os indígenas não estão em extinção. Eles fazem parte de nosso passado, de nosso presente do nosso futuro', conclui o professor.

Reportagem: Fernanda Cavalcante