Publicado em 23 de outubro de 2025 às 12:44
Não foi surpresa para quem acompanha os sucessivos recordes de temperatura, mas agora o secretário-geral da Organização das Nações Unidas (ONU), Antonio Guterres, admitiu. “Não conseguiremos conter o aquecimento global abaixo de 1,5 °C nos próximos anos.">
A declaração é dada às vésperas da Cúpula do Clima das Nações Unidas (COP-30), que será realizada em Belém, em novembro. É a primeira conferência sediada na Amazônia, em um momento de fragilização dos organizamos multilaterais.>
Muitos climatologistas concordam que o teto de 1,5ºc será provavelmente alcançado antes do fim da década, uma vez que o planeta consome cada vez mais petróleo, gás e carvão. O clima já está, em média, 1,4 °C mais quente do que antes, segundo o Observatório Europeu Copernicus.>
A fala de Guterres não deve ser interpretada como sinalização para desmobilizar esforços, mas o contrário. Especialistas apontam que o aquecimento global é uma realidade e é preciso acelerar a adaptação climática e a transição energética.>
Como objetivo menos ambicioso, o Acordo de Paris estipula que os países devem ficar abaixo dos 2 °C até 2100. Especialistas, porém, dizem que os efeitos do aquecimento global serão cada vez mais desastrosos enquanto nos aproximamos dessa faixa.>
Guterres declarou que as metas climáticas propostas pelos países para reduzir as emissões de carbono estão longe de alcançar o objetivo de 1,5 °C e que uma ultrapassagem terá consequências “devastadoras”. Não são previstas sanções para os países que descumprem esses compromissos (chamados de NDCs), que são voluntários.>
A ONU está avaliando esses planos — muitos dos quais ainda não foram apresentados — que estabelecem metas de redução de emissões de carbono para 2035 e detalham os meios para alcançá-las. Guterres notou que os compromissos que cobrem 70% das emissões globais permitiriam apenas uma redução da poluição por carbono de cerca de 10% até 2035.>
O Grupo Intergovernamental de Especialistas sobre as Mudanças Climáticas (IPCC) da ONU enfatiza que as emissões devem diminuir 60% até 2035, ante os níveis de 2019, para ter boa chance de limitar o aquecimento a 1,5 °C (ou ultrapassá-lo de forma limitada).>
“A ciência nos diz que é necessária uma ambição muito maior”, afirmou Guterres. Ele também fez um apelo para que os países cheguem na COP-30 a um plano de US$ 1,3 trilhão de financiamento climático até 2035 para os países em desenvolvimento, para evitar prejuízos maiores.>
“O Brasil será devastado se o aquecimento global sair do controle”, afirmou ao Estadão em agosto o biólogo Philip Fearnside. Ele, que vive na Amazônia, ganhou um Nobel da Paz em 2007 junto com outros cientistas pelos esforços contra a crise climática.>
As previsões dos especialistas é de risco de colapso da floresta, com alterações bruscas em nosso regime de chuvas e consequências negativas para o agronegócio. Também devem aumentar as catástrofes ambientais, como a inundação recorde que devastou o Rio Grande do Sul em 2024.>
A COP-30 terá o desafio de unir os países contra a crise climática, em um cenário de guerras comerciais e conflitos bélicos, como a da Ucrânia e a da Faixa de Gaza.>
Pesa negativamente ainda a saída dos Estados Unidos do Acordo de Paris. Donald Trump, que voltou à Casa Branca, ridicularizou a ciência climática na Assembleia Geral da ONU no mês passado: “o maior embuste jamais perpetrado”.>
A onda negacionista ganha mais entusiastas, como o argentino Javier Milei, que também cogita abandonar o Acordo de Paris. Guterres, por outro lado, fez um apelo para combater a desinformação climática.>
“Em todo o lugar devemos lutar contra a desinformação, o assédio online e o greenwashing”, declarou o chefe da ONU. Sem a ciência e os dados climáticos “claros”, o mundo nunca teria compreendido o surgimento da “ameaça perigosa e existencial da mudança climática”, acrescentou, insistindo em que “os cientistas e pesquisadores nunca devem temer dizer a verdade”. >